Em setembro deste ano, o conselheiro do Tribunal de Contas do Estado (TCE) do Maranhão, Nonato Lago, vai se aposentar. A dúvida é: a vaga que será aberta pertence à Assembleia Legislativa Estadual, ao Ministério Público de Contas ou seria de livre nomeação do Chefe do Executivo?
Conforme já mostramos anteriormente, a Constituição Federal e também a Constituição do Estado, estabelecem que o TCE é composto por sete conselheiros, cuja divisão deve ser: três vagas do Poder Executivo e quatro destinadas a Assembleia Legislativa.
Do Executivo, uma deve ser de escolha do governador do estado e avalizada pela Assembleia Legislativa, outra destinada aos auditores de carreira e a terceira destinada ao Ministério Público de Contas (MPC).
Desde o início da semana, algumas matérias divulgadas na imprensa, dão como certa, a vaga de Lago ao Parquet de Contas. No entanto, essa afirmação contraria expressamente a Carta Magna brasileira e várias decisões judiciais do Supremo Tribunal Federal, que exerce a função de guardião da Constituição Federal.
Paradoxo sobre o tema
Prova disso, por exemplo, que em 2007 – ano em que o MPC veio a se consolidar no Maranhão –, com o ingresso de quatro procuradores de Contas aprovados em concurso público, o STF julgava a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 3.688-2, proposta pela Associação dos Membros dos Tribunais de Contas do Brasil (Atricon), questionando a desproporcionalidade na escolha de membros do TCE de Pernambuco.
Na época, o então ministro Joaquim Barbosa, que foi relator do caso na Corte, trouxe alguns posicionamentos que reforçam a tese do titular do blog sobre o assunto. Naquele ano, o relator chegou a classificar o tema de paradoxo.
“Há um aparente paradoxo em se levar adiante as duas teses (contrapostas) expostas na presente ação direta. De um lado, se afirma que é preciso respeitar a proporcionalidade entre Legislativo e Executivo, exigida pela Constituição, na escolha de membros do Tribunal de Contas estadual – como quer o requerente –, não se permitirá o acesso a membro oriundo do Ministério Público junto à Corte de Contas, exigência também contida na Constituição. Se, de um lado, dá-se preponderância à escolha de membro do Ministério Público, a proporcionalidade mencionada entre Legislativo e Executivo não será respeitada”, destacou o relator.
Resposta ao problema
O próprio ministro do STF explicou, com base no texto constitucional, como é possível resolver o paradoxo diante de uma situação de transição na composição de um Tribunal de Contas estadual que ainda não está totalmente adequado ao artigo 73, § 2º, da CF/1988, como é o caso, por exemplo do TCE-MA.
“O paradoxo é de ser resolvido levando em conta um critério bem explicitado pelo min. Sepúlveda Pertence em diversas oportunidades: na solução de problemas oriundos de transição de modelos constitucionais, deve prevalecer a interpretação que viabilize, mais rapidamente, a implementação do novo modelo”, informou.
A quem cabe a nomeação?
Neste sentido, por ocasião do julgamento da ADI 1957 MC, Pleno, rel. min. Néri da Silveira, DJ de 11.06. 1999, alguns critérios para a resolução do aparente paradoxo foram trazidos. Foi com base nisso, que o ministro Marco Aurélio, ao proferir seu voto, que compôs a maioria no caso, fez uma distinção que parece fundamental, ante a impossibilidade de, em alguns casos, fazer valer simultaneamente a proporcionalidade de indicação pelos Poderes e a representatividade da clientela nas indicações do Executivo.
“Senhor Presidente, entendo que cumpre distinguir valores: o primeiro diz respeito à iniciativa da nomeação, e aí temos, de um lado, o Chefe do Poder Executivo e, de outro, a Assembleia; o segundo refere-se à clientela. Somente após definirmos a quem cabe a nomeação é que partimos para a clientela”, disse.
Catividade das vagas
O raciocínio exposto parece claro e decorre diretamente da Constituição. A possibilidade de escolha de uma determinada clientela pressupõe, sempre, a competência de um dos Poderes para indicar membros do Tribunal de Contas estadual. Sem tal competência, não se pode falar em escolha de determinada clientela. Por essa razão, o ministro Marco Aurélio destacou que primeiro deve-se permitir a qual dos poderes cabe a indicação para somente, em um segundo momento, caso a competência do governador esteja configurada, se saber qual clientela será escolhida.
“Desse posicionamento resulta claro que, ainda nos casos de tribunais de contas que estejam em situação de transição, cadeiras inicialmente preenchidas, após a CF/1988, por indicação da Assembleia Legislativa, tornam-se, verdadeiramente, cativas, no sentido de que somente poderão ser preenchidas, após estarem vagas, por nova indicação também da Assembleia Legislativa”, diz trecho da decisão.
Assembleia em desvantagem
É com base nessas decisões, que o titular do blog vem mostrando que a vaga do conselheiro Nonato Lago no TCE ao MPC seria inconstitucional, pois a indicação iria manter a desproporcionalidade na composição, conforme orienta a própria Constituição Federal. Atualmente, a Assembleia Legislativa possui 3 vagas contra 4 do Executivo. Se for confirmada a titularidade de um membro do Parquet, o preenchimento de vagas permaneceria irregular por não seguir o modelo constitucional, na forma preconizada também pelas decisões do STF.
Fraude levou a erro de interpretação
Curioso é que na guerra pela indicação da vaga, um documento emitido pelo próprio TCE-MA sobre a origem das vagas no Pleno, obtido com exclusividade pelo blog, coloca os conselheiros Raimundo Oliveira Filho (maio de 1986) e Álvaro César de França Ferreira (janeiro de 1988), como origem de vaga do Poder Legislativo. O problema, entretanto, é que a nomeação ocorreu numa época em que a Assembleia sequer fazia indicação ao órgão, mas esse é um assunto que iremos abordar em nossa próxima matéria.